*FUGAS...
Jaz em mim, cristalizado, o instante irrepetível
que, algum dia, em algum lugar, me avassalou
e que, às vezes, ainda me grita na memória o gesto,
a ousadia, a palavra vã, a ilusão plena...
Tantas foram as fantasias,
para além dos óbvios sentimentos,
que se intersectaram noutros submundos,
prefigurados em outros seres, ainda hoje incógnitos,
anónimos, distantes, amados ou desamados...
Muito além desta imensa solidão
que me define e persegue, dramática,
impossível de transpor, esta distância
que me acompanha, passo a passo,
pelos espaços contínuos do olhar
que verto sobre os outros, que titulo
como "imenso tu"...
Jocoso pensamento, talvez vagamente choroso também,
vertido de todo o meu ser, em cada cor,
em cada dia, em cada olhar perdido.
Mas, enigmaticamente, envolvo-me sempre
no abraço esfarrapado e desabrigado
do ser carente que me demanda...
Sou assim, uma unidade carismática, maquilhada,
mas oculta, plena de não saberes e vontades férreas.
No amor, acontece despir-me em desejos imperiosos,
beirando alguma auto crueldade, pela perda de mim,
numa comunhão que se esconde em análises
subliminares...
As únicas fugas deste ensimesmamento cruel
e intrínseco, enquanto ser comungante, pensante e terno,
que me suponho ser, são essas vagas de amor
tão absurdas como sublimes...
Nelas me reencontro, no momento único
em que tudo parece valer a pena.
Sem que eu consiga perceber qual será essa pena.
E só me resta esse mesmo amor, que me salva e pacifica,
supondo que sempre se esconde em mim alguma pena...
Arakné
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