O Mito de Arakné (antiga lenda grega)


Entre os deuses que habitavam no Olimpo reinava Atena, deusa da Sabedoria e de todas as Artes... A bela Arakné era uma extraordinária bordadeira, cujos trabalhos maravilhosos eram admirados por todos os que os contemplavam:

- Que mãos preciosas tem!... que harmonia de cores!... que obras de arte!...

Tais elogios envaideceram tanto Arakné, que um dia exclamou:

- Se eu desafiasse a deusa Atena tenho a certeza de que ganharia!

Logo as ninfas do bosque correram a contar as suas palavras à deusa que, enfurecida pela afronta, logo aceitou o desafio... No dia marcado, Atena executou o seu bordado com muita arte e empenho mas, quando terminou, percebeu que a obra de Arakné era realmente muito mais bela que a sua... Enraivecida, rasgou o bordado da sua rival em mil pedaços e, em seguida, transformou-a numa aranha para todo o sempre...

(Lenda Mitológica Grega)


quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

*REVERSO INVERSO

Perduram em mim sensações leves e ténues memórias, 

invisíveis, vibráteis, translúcidas como marcas de água,

em esbatidas tonalidades, calidamente irisadas e indefinidas, 

envoltas em longas melancolias ou curtas risadas 

divertidas ou sarcásticas, estranhas fantasias 

que temperam momentos fugazes que me surpreendem e retêm.


Sustentada no impercetível suspiro da nostalgia 

onde se diluem restos de nadas, algo do que sobra das dores 

e, quase incógnitos, vestígios do que fui, do que pensei ser, 

do que sonhei que seria, do que nunca fui.


Amiúde, disperso-me em estranhas conjeturas 

nas quais me busco, desesperada, tentando encontrar 

um rasto do que fui e desconheço, porque não nasceu, 

não  viveu, apenas morreu.


Do Passado, chegam-me desmaiados ruídos,

murmúrios em que adivinho frases ou reconheço  vozes. 

Sinto espinhos enterrados, dores mascaradas só assinaladas 

por gotículas minúsculas de sangue vivo.

E as súplicas que larguei pelo caminho, num rasto desfeito

pela caminhada, por vias que construí e logo desconstruí.


Busco os sonhos em que almejava voos e caía, 

num desânimo de asas frágeis, demasiado pequenas

perante o império das razões. 

Viajei ventos, nuvens e marés, no choro de mágoa oculta, 

na secreta culpa, no perdão desmaiado.


Pelas margens do abismo que me convocava

ou pelas planícies onde me perdia dos horizontes,

seguia rotas escolhidas ao acaso, que me conduziam 

aos acasos desconexos, onde  procurava sentidos.

Exausta, sentava-me nas pedras soltas do caminho

e observava os sulcos deixados pelos meus passos 

e o quanto me perdia sem perceber o descaminho...


Transpus mágoas que escorreram para o fundo 

deste abismo que sou, gravando marcas invisíveis

no meu olhar que já não derramava lágrimas. 

Experimentei o grito, a voz, a súplica exaltada, 

mais adivinhada do que escutada, rolando num eco

longo, distante, tímido.


Perco-me ainda neste poço tão profundo que reflete o céu 

e acolhe o grito desgarrado, a ilusão do choro, a queixa 

inexplicável, a graça inexistente, a deixa jamais cumprida.


No sonho diletante de um sono intranquilo, 

no mistério absurdo de um horizonte apagado,

nas profundezas por onde o que fui se consumiu, 

no mar alteroso em que um barco se afundou

sem rota, sem rumo, sem luta...


Reconheço-me, por fim, no rumo, na rota, na luta, 

nos traços visíveis deste céu invertido que sou eu.

Arakné


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