*DEVANEIO NOTURNO
No silêncio ruidosamente impuro
das noites, jaz, intensa e poderosa,
a confusão dos sentidos rarefeitos
e compõe-se, em tangíveis harmonias
e sons íntimos, uma inaudível música,
só minha.
Fantasia forjada em molde perfeito,
desenhada no paradoxo desta noite solitária
em que som e silêncio casam intimidades,
geradas nas palavras mudas que o dia omitiu,
mas que logo a noite gritou impiedosa,
num diálogo destemperado, a sós.
Questiona-me o momento, o pensamento,
o instante que perdura eternidades
em discreta angústia.
O fio da vida insiste em ignorar-me
no enrolar do emaranhado novelo
que tece os dias inquietos, que o tempo empoeira.
Questiono a dormência repetida como um eco
monótono, seco, dolorido de si próprio.
Em breve nascerá um sol demolidor,
invasor de trevas, destronando fantasmas penosos.
Brutal, a turva clareza dos sons vazios
que escorregam em estilhaços, sem cores para ver
ou sons para escutar.
Observo as sombras e brilhos que se compõem
em silhuetas dançando na obscuridade fresca.
Observo fascinada as cortinas ondulantes
como véus reveladores de brisas frescas
e odores de maresia.
Banho-me nos tons frios deste silêncio que amo,
no murmúrio de eterna onda desta música
que só para mim canta.
O silêncio pleno, tão cheio de momento e sentido.
A solidão cheia, tão plena de mundo e som.
Arakné
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